A solidão é fera, solidão devora, é amiga das horas, prima e irmã do tempo que faz nossos relógios caminharem lentos, causando um descompasso no meu coração... (Alceu Valença)
Em algumas partes do dia, normalmente quando acordo,
passo uns instantes sozinhos sincronizando-me comigo mesmo. Este é um exercício
saudável, faz você perceber que acordou e se possível lembrar de ontem para
fazer os planos de hoje. Às vezes eu até sonho, pode até se que isto ocorra
todas as noites, mas nem todas as manhãs eu tenho consciência de minhas viagens
astrais. Às vezes, e só às vezes, eu me levanto com algumas impressões que
insisti ou trouxe involuntariamente do mundo dos sonhos, do plano invisível ou
imaginário que só existe quando em estado dormente percorremos outros caminhos,
mares aqui, nunca dantes navegados. Hoje em especial, acordei esperando receber
uma mensagem no telefone celular, dizem por ai que o telefone ao alcance da mão
é sintomaticamente simbólico, mas não é disso que quero falar, nem da mensagem
que não veio, afinal ela seria minha e particularmente intransferível como uma
impressão digital. Então eu me dei conta, como havia falado, que ao menos havia
acordado, pratiquei os mesmos hábitos, fiz aquele velho exercício de meditação
com a escova dental, ouvi o mensageiro dos ventos dizendo que La fora tinha
sol, vento, plantas e havia vida, inclusive numa minúscula formiga que subia
meu braço enquanto escovava os dentes. Abasteci-me de comida, pouca, e reguei
as plantas. Tudo parece muito normal, quando não se tem alguém que lhe aponte
com precisão que você não é normal e você apodera-se dessa ideia como um
fragmento conceitual de sua existência naquele momento. Eu vivo muito assim,
apoderando-me do que parece ser mergulhado nas impressões pessoais daquilo que
leio e só diz respeito ao que eu leio daquilo que se lê. Estar sozinho é uma
sensação que ocorre levianamente a todas as pessoas. Levianamente, porque nunca
estamos. Apenas sentimos falta de algo que nos complete. Hoje por exemplo,
sozinho, após delegar e cumprir as obrigações aqui descritas sem nenhum
propósito, voltei a ler um livro que optei “por obra do acaso” reler e me senti
incomodado, posso até dizer que me senti invadido. Sim, no alto das 115 páginas
que percebi haver atingido, o livro me dizia coisas que talvez eu não quisesse
ouvir e isso significa uma companhia invasora, um hospedeiro intruso a despeito
da sua própria consciência. Acontece que o mundo (ou o Universo) não para em
respeito ao nosso estado de espírito, nós é quem temos de acompanha-lo nos
reformando a cada passo. Outro dia inclusive, comentava com uma pessoa mais próxima
sobre a arte de decodificar as respostas que Deus nos dá, ele sempre nos ouve,
sempre nos atende, nós quem não somos inteligentes o suficiente e capazes de
entender, de falar sua língua, de senti-lo mais perto quando nos vemos ao
longe, e negamos para nós mesmos essas formas (des)humanas de comunicação.
Preferimos repelir-nos em nome de alguma coisa que ai está e permanece insistentemente
para nos desafiar, para nos desconfortar e invadir a nossa própria solidão. Só
para finalizar, a mensagem acabou de chegar, e sobre ela, não interessa a
ninguém se contém em seus 15 caracteres com quatro espaçamentos o que eu
esperava, o que eu merecia ou o que eu precisava.
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