Acho que nunca vou
esquecer uma reunião chata, que participei um tempo atrás, em que tirei do
palestrante minha atenção para depositá-la única, e exclusivamente, em um
exemplar velhinho de Morte e vida
Severina de João Cabral de Melo Neto. Até hoje, não sei dizer ao certo se o
aceito como poema, embora aceite Os
Lusíadas. Ora, falo aqui da minha predisposição tendenciosa à prosa que
vergonhosamente marginaliza um pouco as rimas; mas devo confessar Seu João, que
sufocando meu fôlego, ative de uma sentada só meu pomposo encantamento pelo
livro. O que nem sempre me causam os cordéis. Sendo que mais tarde entraria em meu primeiro romance. Registro o fato, porque
com frequência vejo muita gente acreditar que quatorze linhas divididas
em dois grupos de quatro e dois de três, com o mesmo número de sílabas rimadas,
pode ser um soneto tetrarca. E parece que é!
Devo dizer-lhes, entretanto,
que a Literatura não dispõe de fórmulas matemáticas. Vejam o conto, por
exemplo. As tentativas em defini-lo partindo de uma única forma são fadadas ao
fracasso; sua natureza não dispõe de um mecanismo encaixotado como o soneto.
Mecanismo este, que nem sempre é bem vindo na poesia. O próprio João Cabral,
para continuar sob a égide dos grandes, disse em 1994 em entrevista a José Geraldo
Couto que não se deve poetizar o poema. Isso tiraria sua beleza natural, como
quem ousa perfumar uma rosa.
E essa tentativa muitas
vezes forçosa de encontrar o “verso certo” acaba provocando no texto um excesso
de palavras que só servem para enfeitá-lo, e o desejo do autor/poeta, ou
chamado eu lírico, passa por longe porque a palavra não o atingiu com
plenitude. Esse pecado não é de exclusividade dos poetas. Quantas vezes na
tentativa de embelezar o romance, não encontramos descrições prolixas e
desnecessárias. Lembro agora da minha primeira novela, quando em um dos
capítulos descrevi a pedra do colar da cigana Walquiria “azul marinho da cor do
mar”, evidentemente isso foi corrigido, mas não me retrato apenas a redundância
gramatical, mas às adiposidades literárias que vivem por ai entupindo as veias
artísticas, causando infartos, alguns fulminantes em escritores de um verso só.
Lembremos, portanto,
todos nós que nos abastecemos da escrita para respirar, que nem sempre a
sobrecarga das palavras soma. É mais fácil, entre dois adjetivos, um desprezar
o outro, porque sempre haverá algo como a “rosa” que não precisa de perfume
porque já é por si poética que se difere de “água mole em pedra dura tanto bate
até que fura”. E a frente dessa lição, haverá sempre nomes como Graciliano
Ramos ou Augusto dos Anjos mostrando que não descobrimos nada sobre economia linguística e estamos aqui
para aprender com os melhores.
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