Hamlet de Laurence Oliver
,mas a inquietude
apoderava-se dos labirintos da mente daquele indefeso de si como enunciara alguém, refém e algoz de
sua própria perversidade de ontem, ele nem mesmo conseguia sossegar.
Talvez por nunca se arrepender do que faça, mas lamentar sempre o que deixou de
fazer, ele olhou para trás. Sabia que podia transformar-se numa estátua de sal,
mas preferiu correr o risco porque a Morpheu parecia-lhe elegante demais, e Orpheu sem Eurídice, já dizia o poeta, era algo incompreensível. Pedra rolada... Assim, portanto, arriscou driblar a covardia que há muito andava de braços com a
conveniência sacrossanta e o respeito ungido como se fosse uma flor para dois maridos. Ele então
levantou-se com esforço, escorregou uma ou duas vezes no tapete lamacento que em 2007 havia
sido ricocheteado por orquídeas brancas. Ele nem sabe se eram brancas, na verdade, mas preferiu imaginar que fossem. Transmutou os pensamentos na absurda
coragem que lhe alvoroçava o peito desnudo e arrepiado; apoderou-se de enxada. Queria esse poder, desejava mais que tudo e ninguém poderia impedí-lo. O cabo
roliço e liso revelavam uso e destreza para com as covas e alcovas. Não sua, é claro. Jamais
havia tentado algo parecido, mas de alguém que melhor lhe representasse em cada
procela que fazia seu barco redemoinhar sob as ondas salgadas das lágrimas
corridas em quase dez anos, menos cinco ensinaram-lhe os matemáticos a desfazer essa conta... Mas ao leme o Capitão estava sempre imponente, independente dos números, dos anos. Esperava avistar as locas
em alto MaR e ouvir o canto da sereia. O canto que diz a lenda, escraviza e
mata após seduzir, e ele seduzido tirou os olhos do cabo e mirou a base oxidada
pelas razões a qual renega e nega, nega e nega igual a Pedro. Num abrupto solavanco fez o primeiro corte na
terra. Que dor terrível transpassara-lhe. Não mais havia flores, mas seu chão tremeu. Havia apenas uma inscrição
em epitáfio que ele não conseguia ler; ou nem tentara. Tanto que lhe traduziram
aquilo, mas ele não sabia ser covarde e por isso nem ligava os fatos. Se ele não fizesse aquilo, ninguém mais faria por ele. Fez então mais
três cortes na terra, o mesmo representava três dias silenciosos e fúnebres em que
sua alma saudava a Princesa de Aiocá ao longe na esperança que ela descesse a
ribanceira e o resgatasse ou se deixasse resgatar. Quando ele avistou-lhe a cabeleira lembrou-se que há sempre uma
parte de nós que a terra não come, que o tempo não leva, e ele precisava identificá-la de algum modo, mesmo que não mais a reconhecesse. Puxou-a. Era tarde
demais! Suas mãos prendiam entre os dedos apenas os fios soltos, esmaecidos e
sem trato. Alguma coisa havia sido desligada para sempre mas ele não aceitava. Não conseguiu nem chorar! Tentou
retirar cada fragmento para que pudesse reconstituir o que um dia quebrou sem
querer, mas a fronte esquecida pareceu-lhe estranhamente desconhecida, imaginou
que algumas partes a terra e o tempo modificam, sim. Mas por que não o modificara
também? Desejou estar também soterrado, mas estava congelado desde a última vez que a obliquidade do seu olhar
alcançaram-na e sentiu-se diminuído por não ter sido compreendido por nenhum
poeta, nem mesmo por aqueles que pareciam-lhe tão honestos. Mas não, nem Chico, nem Tom, nem Geraldo... Nada
que eles cantavam simbolizava aquele instante. Era tudo tão inédito que a
sequidão alcançou-lhe a garganta. A aridez da terra, agora representava-se não
no solo calcinado, mas na ponte que ligava sua muda emissão vocal ao desconstruído coração que sozinho se reconheceu por uma calada e absurda justiça. Seu nome? Prometeu jamais esquecer, mas o sol não mais brilhava para si. Jurou em dor. Calou-se. Finou-se.
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