É possível que não me
enquadrando na categoria de leitor cosmopolita na qual prefacia “dezessete”, o
senhor Valério Alfredo Mesquita, discorde da desconstrução regionalista à que
atém José Sávio Lopes.
Antonio Candido, certamente
o maior crítico literário da contemporaneidade – recentemente falecido, nos diz
que a literatura é um produção social que se estabelece diante de uma função
retroalimentativa e se manifesta por dois vieses: o temático e o estético.
Se do ponto de vista temático,
o autor dos romances “São Sebastião da bexiga e o gênesis trinta e oito” e “Quem
matou Odilon Peixoto?”, preserva em “dezessete” a despretensiosa linguagem de
um brejeiro erudito; do estético então nem se fala! A formatação ensaística das
obras de Sávio favorecem pelo discurso direto e indireto livre, a composição de
personagens reais e fictícios sob um panorama completamente interiorano, no
mais completo “furgere urbem” de um
território marginal elástico à civilização moderna pretensiosamente aparelhada
à emancipação. Esta, sendo ainda, uma questão de composição espacial, para além
do geográfico, se manifesta livremente não só pelas paisagens, mas pelas
emoções despojadas em um Mestre Antõe, por exemplo, cantando para um rei nas
portas de um castelo nos fazendo através da consciência coletiva, rememorar o
reino encantado que tão bem desvelou o regionalista moderno/ contemporâneo
Ariano Suassuna.
Dezessete não é um romance
metropolitano, bem como – creio, não seja a alma de seu autor; mas um romance
histórico costurado pelas vielas da revolução de 1817, “[...] também conhecida
como a Revolução Pernambucana ou Revolta dos Padres, tinha como objetivo criar
o norte do Brasil, uma república livre do domínio português.” (LOPES, 2017, p.
37), e inaugura, não apenas pelo escaninho cabalístico de estar sendo lançado
em 17 (2017), mas pela orquestração dos elementos narrativos e documentos
históricos, que segundo atesta o também comentarista da obra Nelson Patriota,
um eficaz método de escrita, um modelo de literatura completamente inovador nas
terras potiguares: o romance histórico baseado em fatos reais (vide pesquisa
documental).
Ressalvo ainda a não
submissão a tirania gramatical que preserva nos romances de Sávio o dialeto
regionalista que contribuem para a preservação da espécie. E como, pois, não
compreendê-lo como regionalista? Enquanto professor de Literatura gostaria de
me oportunizar destes escritos para esclarecer uma inquietude que recorrentemente
vem à tona: O que é ser regionalista? Anos passamos estudando em método
decorativo autores pertinentes a essa categoria. Escritores como Euclides da
Cunha, Raquel de Queiroz, Graciliano Ramos entre outros e permanecemos presos a
geografia do texto e ao período de produção, apenas. No entanto, esse
pensamento é muito pequeno e provinciano, e nada cosmopolita! O regionalismo
não está restringido ao nordeste, nem muito menos ao cangaço. Cada estado/
região de um lugar é por si regionalista, absolutista em sua cultura e
sobretudo em sua linguagem. Não há razões geográficas nem literárias para não
considerar “a hora da estrela” de Clarice Lispector, por exemplo, um romance
regionalista. O processo migratório da personagem é o mesmo dos retirantes em “vidas
secas”, de Graciliano Ramos, a situação existencial é que muda, e isso é
atendido conforme as verdades de cada época.
Em outras palavras, por mais
fiel que Sávio tenha sido, ao estabelecer em seu propósito romanesco o reconto
de fatos reais, há um distanciamento dos fatos em ebulição na mete de um
novelista e, dentro dessa chaleira, uma xícara é servida em cada capítulo
fundindo-se o real e o imaginário na perspectiva mais congruente da literatura:
a universalização.
Da freguesia de Pau dos
Ferros
Fernando Júnior, 07 de setembro
de 2017.
Data em que morreu o tirano General
Luís do Rêgo Barreto, nomeado por D. João VI comandante da repressão que
massacrou os pernambucanos em 1817.
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