Dali a tempos já havia se revelado uma heroína, não
dessas inglesas cujos olhos em tom machadiano se banhando nas águas
shakesperianas, diluem-se em leite ante as tonalidades que no Brasil revelam-se
inoperantes, mas de um ímpeto abrupto cuja fortaleza se desvela no pretume do
olhar majestoso ao observar pela segunda vez uma cena partilhada em crônicas
mudas. Silenciosa, da primeira vez me disse marejando os olhos – numa carona,
que sentiu seu coração partir ao ver uma pobre senhora apanhando da lata de
lixo um lanche para alimentar seu filho colado à barra da saia; o lanche havia
sido jogado por alguém da sacada de um prédio e isso bastou para silenciar toda
moral da história tornando a crônica mais muda que a das palavras não escritas.
Hoje, convicta das voltas que a vida dá, algum tempo depois daquela cena, da
simplicidade buscada pelo poeta, inconscientemente até, não sabendo que suas
experiências me inspiram, trouxe-me imageticamente a cena mais pura de uma
infância transbordada de grandes prazeres, daquelas que não se vive mais, apenas
cobiçada de uma sacada, não do mesmo prédio, mas pelos mesmos olhos que
preservam o negrume e a essência do coração de menina grande que bate, no
embalo do balanço daquele garoto, na mesma intensidade que alcança o frenesi do
empurrador, seja pai, amigo, irmão, não importando quem, sem saber que estão
sendo observados por outro quem quer que seja, e daquele lugar, n’aquela
condição, daria um pouco mais que a volta no quarteirão para tranquilizar-se
das asperezas e da dureza da vida real, vivendo apenas como ele: no balanço
recôndito de uma algaroba como se fosse o regaço acolhedor de sua mãe. Esse
texto não pode continuar, ele precisa ser cristalizado com o mesmo gesto que o
olhar perdido divagou-se por quase hora cenográfica, reproduzida em alguns
instantes e abraçada a som da canção que invade este ambiente.
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